Edson Duarte (PV) foi deputado estadual por duas vezes e está no seu segundo mandato como deputado federal. Líder da bancada do Partido Verde pela quarta vez, Duarte começou sua carreira política nos movimentos sociais. Nesta entrevista ao Política Hoje, o [único] candidato do PV ao Senado faz questão de enfatizar que “não venho de uma família de políticos” e fala sobre o processo de decisão do PV por sua candidatura, negando que tenha existido qualquer tipo de mal-estar entre ele e Bete Wagner, que concorre a uma vaga na Assembleia Legislativa. Na linha de ‘oposição light’, Duarte diz que o governo Lula “cumpriu um papel importante no seu tempo”, mas que faltou “ir além”. O mesmo tom de crítica suave é usado para apontar a “falta de ousadia” do governo Wagner, que, na visão do candidato, “tem pontos positivos que precisam ser reconhecidos”. Confira.
Política Hoje: O senhor disse que não tem nenhum parente na política ou trabalhando com o senhor. É uma regra rígida que o senhor segue ou faltou oportunidade?
Edson Duarte: Eu aconselho eles a seguirem o que eles têm vocação mais forte. Não é que eu não os queira na atividade política, mas, se isso acontecer, que seja por mérito e vontade próprios e não como herança da minha atuação política. Eu acho grave confundir o interesse público com projeto familiar ou pessoal.
Política Hoje: O senhor comentou seu apoio ao governo Lula. Qual a avaliação que o senhor faz desses oito anos de governo Lula? O que o senhor destacaria de positivo na questão ambiental? Há alguma tentativa do partido de “colar” a sua imagem com o governo Lula?
Edson Duarte: Não. Nós estamos propondo um governo para além do governo Lula, que cumpriu um papel importante no seu tempo. Assim como Fernando Henrique Cardoso cumpriu um papel importante na sua época. Não caberia um governo Fernando Henrique no tempo que foi o governo de Lula, assim como nós entendemos agora que cabe uma visão pós-governo Lula. Não dá pra ter um governo que só venha pra repetir o que já teve, é preciso ter um olhar para além. E foi aí justamente onde o governo Lula foi mais frágil. O governo Lula conseguiu manter uma política econômica estável, uma economia sólida e blindada contra esses tremores que aconteceram na economia mundial e conseguiu desenvolver um projeto social de resgate das pessoas que estavam na linha da extrema pobreza. Isso era urgente, mas não podemos parar por aí. Esse resgate está fazendo, inclusive, com que haja uma interferência no resultado eleitoral. O resultado dos programas sociais, num país com tanta gente necessitada…há uma dívida hoje em relação ao Lula que está sendo paga com o voto. Mas nós precisamos dar um passo além disso, precisamos do que a Marina chama de terceira geração dos programas sociais. Fazer com que as pessoas encontrem alternativa e autonomia para construir suas vidas, no sentido de ter independência dos programas sociais. Fazer com que as instituições do Brasil se fortaleçam. Acho que uma das dívidas do governo Lula diz respeito justamente ao fortalecimento das instituições. Ele fez isso com a Polícia Federal, mas precisava ir além. Era preciso fazer isso em relação à Sudene, DNOCS, Codevasf, Ibama, a diversas instituições da esfera federal que acabaram sendo contaminadas por indicações políticas, pessoas cuja prioridade era atender mais ao grupo, partido ou chefe político que as indicou do que à instituição.
Política Hoje: Para o senhor, essa prática se aplica ao governo estadual?
Edson Duarte: Sim. O equívoco cometido pelo governo Wagner, que foi inclusive um dos motivos do nosso afastamento – porque o governo Wagner tem pontos positivos que precisam ser reconhecidos – mas fazer um gerenciamento bom é obrigação, não pode ser entendido como algo revolucionário. Aliás, é uma pena que um governo como o governo Lula, que resgate as pessoas da extrema pobreza e que mantenha a economia equilibrada, seja motivo para endeusamento e seja visto como se fosse uma revolução. Isso é algo que deveria ser básico, fundamental. Eu acho que a revolução seria na educação e essa revolução não aconteceu. A nossa educação continua chata, formal, burocrática, pra cumprir tabela e atender apenas a números: tantos alunos que entraram, tantos alunos que deixaram de sair. Falta uma educação para a vida, uma educação que leve as pessoas a repensarem suas vidas, o mundo em que elas estão vivendo. Esse deveria ser o papel da educação.
Política Hoje: No pensamento do senhor, falta o quê? Falta, por exemplo, arte?
Edson Duarte: Falta arte, falta ousar, falta sonhar um pouco mais. Eu acho que um mal do governo Lula e do governo Wagner, assim como de todos os governos, é entrar no primeiro dia de mandato pensando na reeleição. Esse é um problema terrível. E tudo que se faz é muito no sentido de “isso dá voto”, “isso tira voto”, “isso é pra beneficiar um aliado”, “quem é que está sendo beneficiado com essa ação?”. Eu acho que quem está nos mandatos acaba ficando por demais refém das eleições. Então tudo que se faz é pensando na próxima eleição, na reeleição, na eleição do aliado. Isso tem feito um mal danado aos governos. Aqui no governo da Bahia, se repetiu um pouco do que aconteceu no governo federal: você atrai aliados não pensando só na governança, pensando na governabilidade pra dar sustentação aos projetos que estão de olho na reeleição.
Política Hoje: Mesmo com todas essas implicações, o senhor e Mão Branca foram os dois deputados que mais conseguiram algum tipo de investimento para a Bahia. O senhor sabe para onde foram esses investimentos, onde foram utilizados?
Edson Duarte: Isso é interessante: eu fui um dos deputados que mais conseguiu mobilizar recursos para o estado da Bahia e nós só temos três prefeitos do Partido Verde. O que eu faço em relação a projetos, emendas recursos: eu solicito projetos. Por exemplo, eu solicito ao DNOCS, às instituições, às faculdades, que apresentem projetos e todos apresentam. Depois, eu analiso e peço sempre uma explicação: a quem atende, custo-benefício do projeto, ou seja, quantas pessoas serão atendidas e qual o valor do benefício. Quanto menor o valor e maior a quantidade de pessoas atendidas, melhor. Segundo: o projeto tem sustentabilidade ou é um projeto no qual você vai gastar recursos agora e, daqui a alguns anos, deixará de existir? Ele estará resolvendo a vida das pessoas? Terceiro – algo que eu considero muito importante: quem vai tocar esse projeto tem credibilidade? Por exemplo: tem um município da Bahia chamado Lapão, que talvez seja um dos municípios mais beneficiados por mim e eu nunca tive voto lá. O prefeito de lá é muito sério, organizado. Ele é do PMDB, Hermenildes. Ele recebeu muitos recursos e eu nunca fui votado lá – também não faço isso como compromisso de que tenham que votar em mim, até porque o maior volume de recursos eu consegui nesse último mandato, quando eu já tinha decidido que não seria mais candidato à reeleição e não havia a menor possibilidade de que Marina fosse candidata a presidente e que nós do PV teríamos na Bahia candidatos a governador e ao Senado. Então isso tudo surgiu de repente, os fatos aconteceram e me convocaram pra missão de ser candidato ao Senado.
Política Hoje: O senhor acredita que é pelo fato da sua candidatura ter acontecido dessa forma que o PV não teve um segundo candidato ao Senado? Ou isso é uma estratégia?
Edson Duarte: Foi uma estratégia. A gente está disputando uma vaga. Se o partido não consegue se entender a ponto de ter um projeto para o Senado, como esperar que a sociedade possa apostar no candidato se nem o partido consegue se unir?
Política Hoje: Há um desentendimento no partido?
Edson Duarte: Não, eu não diria um desentendimento e sim posições divergentes. Alguns não acreditavam na eleição de um candidato do partido e achavam que as vagas deveriam ser utilizadas como promoção das pessoas, ou seja, usar o tempo destinado para o senador para promover. Eu sou contra isso. Acho que é um grande mal à democracia.
Política Hoje: Houve algum mal-estar entre o senhor e Bete Wagner por conta disso?
Edson Duarte: Não, porque são discussões políticas, não são pessoais. Até porque eu não briguei para ser candidato.
Política Hoje: Mas politicamente falando, houve?
Edson Duarte: Não, até porque hoje está compreendido que foi um acerto ter lançado só um candidato. O PV tem chances de eleger o seu senador. 80% dos eleitores baianos não decidiram ainda seu segundo voto para o Senado. E em relação ao primeiro voto, mais da metade dos baianos ainda não tem candidato. A eleição está aberta. Se o Partido Verde apresenta com a Marina um candidato ao Senado – e tem que ser um para que não haja divisão do esforço, da visibilidade, do projeto – o PV pode se apresentar como a candidatura ideal para o segundo voto nessa relação com as outras candidaturas e, dessa forma, a possibilidade do PV vir a fazer um senador é total. Para isso, nós precisávamos, logicamente, tomar a decisão que tomamos, que foi a de lançar apenas uma candidatura.
Política Hoje: Havendo um segundo turno nas eleições presidenciais entre Serra e Dilma, quem o PV apoia?
Edson Duarte: Nós acreditamos na Marina no segundo turno. Caso a Marina não vá, aí nós ainda iremos discutir. Isso não foi discutido porque não é tempo para isso. Nós não discutimos segundo turno porque ainda estamos no primeiro e o nosso objetivo é fazer com que a eleição vá para o segundo turno. Acho que o povo brasileiro, assim como o baiano, que conhece de política sabe como é importante que tenha o segundo turno. Porque é no segundo turno que as propostas se revelam com mais nitidez e que os compromissos com o país e com estados se firmam com maior clareza. E isso faz com que os governantes que venham a ser eleitos no segundo turno tenham que negociar politicamente essa sua relação de governabilidade. Isso é bom para a democracia. É comum que a vitória no primeiro turno gere na cabeça do eleito uma sensação de onipotência, de poder exacerbado, de que não é preciso dialogar e de que ele tem todo o poder à sua volta. Isso é muito ruim, geralmente faz muito mal pra cabeça do eleito.
Política Hoje: Voltando um pouco para a questão do Senado, como o senhor avalia os seus concorrentes?
Edson Duarte: Bons candidatos. A Bahia tem pela primeira vez uma eleição direta para o Senado porque a eleição para o Senado na Bahia sempre foi decidida no Palácio de Ondina. A disputa para ser senador nunca foi no voto, era na indicação. Quem saía daquela porta lá já era cumprimentado como senador. Eleição na Bahia sempre foi para cumprir tabela, para atender a uma mera formalidade da Justiça Eleitoral. Nessas eleições, estão tentando fazer a mesma coisa. Tanto é que tem candidato que nem fala mais no programa eleitoral, bota os outros para falarem. Bota o presidente, bota o governador, como quem diz assim: “Olha, eu já escolhi”. Precisa apenas perguntar ao eleitor se ele concorda com esse jogo decidido nos bastidores do poder. Os candidatos sequer estão procurando os prefeitos, as lideranças do interior. Uma vez indicados por aqueles que têm grande credibilidade eleitoral hoje, acreditam que dessa forma a eleição já está decidida. Esse é um engano que pode custar muito caro porque as lideranças e a própria população do estado já não concordam mais com essa forma de indicação. Candidatos que são escolhidos para manter oligarquias e o Senado sendo usado como espaço compensatório de promoção ou para atender a compromissos feitos nos bastidores da política baiana. Esse modelo está saturado, antigo. O resultado é que o senador eleito dessa forma acha que não tem compromisso com os baianos. O compromisso é com o chefe do grupo, do partido, com a autoridade que o indicou. Nós precisamos de um senador, ou senadores, para os baianos e para a Bahia. É por isso que eu acho que nós teremos um resultado surpreendente. Na hora em que esse eleitorado resolver se decidir, ele vai querer escolher o seu senador. Está na hora desses senadores que estão se escondendo atrás da saia da mãe e do pai, deixando que apenas a mãe e o pai falem por eles, se apresentem e digam porque são candidatos ao Senado sem precisar colocar alguém para falar por eles.
Política Hoje: Candidato, acredito que um dos maiores problemas no andamento dos trabalhos na Câmara, no Senado, na Assembleia, na Câmara Municipal é a falta, ou seja, a ausência dos parlamentares. Hoje saiu uma notícia de que Marina é a quinta senadora mais faltosa. O senhor avalia essas faltas como algo que atrapalhe o andamento dos trabalhos?
Edson Duarte: Não. Há uma deformação na notícia dentro da própria Câmara. Já conversei sobre isso com o presidente Michel Temer. O parlamentar e o Parlamento têm uma série de atribuições. As votações de plenário são uma dessas funções. O voto do plenário é uma das últimas instâncias. Na ação parlamentar, essa é a mais simples, a mais fácil. Ao contrário do que as pessoas imaginam, que chega um projeto para ser votado e é no plenário que se discute e são feitas alterações, não é assim que acontece. O plenário cumpre com uma formalidade do processo, é a assembleia geral para bater o martelo. Toda a discussão de conteúdo, de negociação, se dá nas comissões, nas audiências, nos debates, nas discussões. Isso eu estou falando dos projetos de lei. Mas o Parlamento também tem uma outra atuação, que são as comissões de trabalho, que subsidiam todas as informações que fazem com que o Parlamento represente tudo o que está acontecendo no Brasil. Para que ele possa ter opinião formada sobre cada tema. Essas discussões e esses debates são feitos no Brasil inteiro. Quando um trabalho chega lá no plenário, tem deputado que foi responsável por toda a discussão – noites e dias, muitas vezes com audiências em vários estados, várias cidades. O resultado de todo esse trabalho vai para o plenário. Se o resultado vai para o plenário e a pessoa que fez tudo aquilo permanece fazendo os ajustes e o projeto é votado, ele fica como ausente. No painel aparece quem estava naquele momento dentro do plenário, que são geralmente os que não participaram da construção do processo. Se ele não está ali naquele momento, a Câmara – e isso eu acho um erro – coloca assim: ausência justificada. Mas não é ausência. O que é ausência justificada para um trabalhador? Você não foi trabalhar e deu um atestado, isso é uma ausência justificada. Na Câmara, se você está fazendo um trabalho que, naquele momento, não é exatamente o trabalho no plenário, mas os vários tipos de trabalho possíveis, você não aparece como “em missão”, “em reunião”, “em audiência pública”. Às vezes você está presidindo uma audiência pública, às vezes você está como relator de um grupo de trabalhos da Câmara, às vezes você está até fora do país na relatoria de uma comissão. Há na verdade uma interpretação equivocada, feita pela própria Câmara e, por tabela, isso acaba saindo. Eu vi outro dia um grande jornalista – eu digo grande no sentido de que ele trabalha numa grande empresa de comunicação – dizer assim: “No Parlamento, se trabalha na terça e na quarta”. Ele se refere às votações nominais do plenário. Mas, como eu disse, o plenário é apenas uma e talvez a mais simples de todas as fases na construção de um projeto de lei. É a parte mais tranquila. Geralmente, quando se chega lá, a gente já sabe o resultado. A discussão já ocorreu e você já sabe qual é a posição de cada partido e as posições dentro dos partidos: se está dividido, se o partido concorda integralmente, se metade não concorda. É claro que no plenário cabe que um deputado se rebele, aproveite para dizer que não concorda, tente uma manobra regimentar para impedir a votação. Mas no geral é assim que a democracia é feita, já que não dá para colocar lá dentro 140 milhões de pessoas. É um sistema representativo.
Política Hoje: Como vai ser o Edson Duarte senador, se eleito?
Edson Duarte: Renovado, repaginado. Como tudo na vida se reinventa a cada dia, eu quero usar da minha jovialidade – 44 anos – para levar para o Senado. Eu acho que é o gás que está faltando àquela Casa, que envelheceu bastante. Junto com essa jovialidade, quero casar a experiência de 19 anos de vida pública, de cinco mandatos, quatro vezes líder na Câmara federal. Quero levar lá para dentro um debate novo. O debate de um mundo novo, que busca hoje a sustentabilidade em tudo que faz. Na educação, na saúde, na economia. Em todas as áreas, todas as atividades. É uma nova interpretação de mundo e ela precisa estar presente nas discussões e nos resultados do Senado. O Brasil avançou muito, o Senado ficou para trás. Eu quero trabalhar intensamente no sentido de provocar a Casa e dar a minha colaboração para que o Senado seja repaginado, revisado na sua missão, na sua relação com a sociedade.
Por Marcos Russo